Rafael Salim / Divulgação

O Centro Cultural Banco do Brasil Brasília recebe, de 3 de setembro a 10 de novembro, a exposição Vaivém, que retrata a trajetória das redes de dormir nas artes e na cultura visual no Brasil. Com curadoria de Raphael Fonseca, crítico, historiador da arte e curador do MAC-Niterói, a mostra reúne mais de 300 obras, com recorte entre os séculos 16 ao 21, e a participação de 141 artistas – entre eles, 32 indígenas.

Na seleção, pinturas, esculturas, instalações, fotografias, vídeos, documentos, intervenções e performances, além de objetos de cultura visual, como HQs e selos,  Vaivém está estruturada em seis núcleos temáticos e transhistóricos que serão exibidos nas Galerias 1 e 2 e Pavilhão de Vidro do CCBB.

Na abertura da mostra, no dia 3 de setembro, às 19 horas , o público terá a oportunidade de conhecer o processo de montagem e seleção das obras com o curador Raphael Fonseca. Ele ministra a palestra Construções do Brasil no vaivém da rede de dormir: de pesquisa acadêmica para uma exposição transhistórica, no hall do Museu (1º andar).

A mostra nasce de uma pesquisa de doutorado do curador, que decidiu transformar o trabalho acadêmico em exposição de arte e compartilhar com o público parte das obras que encontrou ao longo dos quatro anos de pesquisa. “Longe de reforçar os estereótipos da tropicalidade, esta exposição investiga as origens das redes e suas representações iconográfica. Ao revisitar o passado conseguimos compreender como um fazer ancestral criado pelos povos ameríndios foi apropriado pelos europeus e, mais de cinco séculos após a invasão das Américas, ocupa um lugar de destaque no panteão que constitui a noção de uma identidade brasileira”, explica Fonseca.

O projeto expográfico criado para Vaivém divide a exposição em núcleos temáticos que facilitam a visitação do público. O primeiro, Resistências e permanências traz as redes como símbolo e objeto onipresente da cultura dos povos originários do Brasil. Neste núcleo, a maioria das obras é produzida por artistas contemporâneos indígenas, como Arissana Pataxó. No vídeo inédito Rede de Tucum, ela documenta Takwara Pataxó, a Dona Nega, única mulher da Reserva da Jaqueira, em Porto Seguro (BA), que ainda guarda o conhecimento sobre a produção das antigas redes de dormir Pataxó, feitas com fibras extraídas das folhas da palmeira Tucum.

Carmézia Emiliano começou a pintar de maneira autodidata em Roraima. Se tornou conhecida por telas que registram o cotidiano dos indígenas Macuxi, muitas protagonizadas por mulheres, e terá expostas pinturas feitas especialmente para o projeto, além de obras mais antigas. Também da etnia Macuxi, Jaider Esbell criou para a mostra a instalação A capitiana conta a nossa história. A uma rede de couro de boi estão presos um texto de autoria do artista e uma publicação com documentos sobre as discussões em torno das áreas indígenas de seu estado.

Outro destaque é Yermollay Caripoune, que, vivendo na região do Oiapoque, entre a aldeia e a cidade, participou de poucas exposições fora do Amapá. Na série de seis desenhos que desenvolveu para Vaivém, o artista apresenta a narrativa dos Karipuna sobre a origem das redes de dormir.

O núcleo reúne ainda trabalhos de grandes nomes da arte brasileira, como fotografias dos artistas e ativistas das causas indígenas Bené Fonteles eCláudia Andujar, e o objeto de Bispo do Rosário Rede de Socorro, uma pequena rede de tecido onde se lê o título da obra.

O segundo núcleo, A rede como escultura, a escultura como rede, reúne trabalhos que apresentam redes de dormir a partir da linguagem escultórica como Rede Social,  uma instalação interativa do coletivo Opavivará!, com uma rede gigante que convida o público a se deitar e balançar ao som de chocalhos.  Fazem parte ainda obras do jovem artista Gustavo Caboco, de Curitiba e filho de mãe indígena, e Sallissa Rosa, nascida em Goiânia e filha de pai indígena. Neste núcleo ainda, uma série de gravuras em que discute seu pertencimento e não-pertencimento às culturas ameríndias no Brasil e Ela, vídeo criado a partir de selfies de mulheres em redes de dormir, que revela uma visão complexa sobre o lugar da mulher indígena na sociedade contemporânea brasileira.

De Hélio Oiticica foram selecionadas fotografias da pouco conhecida série Neyrótika e, de Ernesto Neto, um conjunto de obras do início de sua carreira, nos anos 1980, onde redes não aparecem literalmente, mas são sugeridas em uma dinâmica de tensão e equilíbrio.  Integram ainda o segmento redes de artesãs de diversas regiões do Brasil.

Olhar para o outro, olhar para si, terceiro núcleo da mostra, reúne documentos e trabalhos de artistas históricos e viajantes, como Hans Staden, Jean-Baptiste Debret Johann Moritz Rugendas, que registraram os aspectos da vida no Brasil durante a colonização. Ao lado deles, artistas contemporâneos indígenas foram convidados a desconstruir o olhar eurocêntrico dessas imagens a respeito de seus antepassados e propor novas narrativas.

Entre eles, dois do Amazonas: a pintora Duhigó Tukano, que apresenta a inédita acrílica Nepũ Arquepũ (Rede Macaco), sobre o ritual de nascimento de um bebê Tukano, e Dhiani Pa’saro, ainda pouco conhecido fora de seu estado natal, que expõe a marchetaria Wũnũ Phunô (Rede Preguiça), composta por 33 tipos de madeira e inspirada em duas variações de grafismos indígenas: o “casco de besouro” (Wanano) e o “asa de borboleta” (Ticuna).

Em Disseminações: entre o público e o privado as redes surgem em atividades do cotidiano do Brasil colonial, como mobiliário, meio de transporte e práticas funerárias. Um dos destaques é Dalton Paula, artista afro-brasileiro de Goiás, que lança em suas pinturas um olhar sobre as narrativas a respeito da negritude no Brasil desde a colonização.

Os lugares que as redes ocupam na vida contemporânea no Brasil, em especial na região Norte, também estão pontuados nesse núcleo. Fotografias de Luiz Braga, por exemplo, exibem redes de dormir em cenas do dia-a-dia no Pará.

Seguindo a mostra, no núcleo Modernidades: espaços para a preguiça a rede passa a ser associada à preguiça, à estafa e ao descanso decorrentes do encontro entre o trabalho braçal e o calor tropical. O ponto central é ocupado por “Macunaíma” (1929), livro de Mário de Andrade. O personagem que passa grande parte da história deitado em uma rede está em obras de diferentes linguagens.

Carybé foi o primeiro artista a fazer ilustrações de Macunaíma. Um desenho pouco exibido de Tarsila do Amaral mostra o Batizado de MacunaímaJoaquim Pedro de Andrade dirigiu o longa-metragem que, estrelado por Grande Otelo, completa 50 anos em 2019, e os cartunistasAngelo Abu e Dan X adaptaram a história em quadrinhos.

No espaço também estão Djanira, com o raro autorretrato Descanso na rede, em que surge ao lado de seu cachorro, e peças de mobiliário desenhadas por Paulo Mendes da Rocha Sergio Rodrigues.

E por fim, no núcleo Invenções do Nordeste, foram reunidas obras que transformam em imagens mitos a respeito da relação entre as redes e esta região do país, além de trabalhos em que elas surgem como símbolo de orgulho local e de sua potente indústria têxtil. Destaque para uma série de fotografias de Maurren Bisilliat pelo sertão nordestino e as cerâmicas de Mestre Vitalino que retratam grupos de pessoas enterrando entes dentro de redes.

A exposição traz também obras de Tunga, artista que inaugurou o CCBB São Paulo, em abril de 2001. A instalação Bells Falls ganha uma nova versão e é apresentada ao lado dos registros fotográficos da performance “100 Rede”, realizada em 1997 na Avenida Paulista.

Vaivém esteve em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil São Paulo até 29 de julho. Após a etapa em Brasília, segue para o Rio de Janeiro (dezembro/2019) e Belo Horizonte (março/2020).

 

Serviço:
Vaivém
Local: Galerias 1 e 2 e Pavilhão de Vidro / Centro Cultural Banco do Brasil Brasília
De 3 de setembro a 10 de novembro
Visitação: De terça a domingo, das 9h às 21h

Palestra com o Curador
Construções do Brasil no vaivém da rede de dormir: de pesquisa acadêmica para uma exposição transhistórica”, com Raphael Fonseca
Terça, 3 de setembro, às 19 horas, no hall do Museu (1º andar)

Ingresso: entrada gratuita mediante voucher a ser retirado na bilheteria do CCBB
Endereço: SCES Trecho 2 – Brasília/DF Tel.: 61 3108-7600

Confira mais informações no site: bb.com.br/cultura

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